sexta-feira, 24 de abril de 2009

O “de cujus” educação

O “de cujus” educação
O menoscabo do governo face a educação – observações quanto ao novo projeto de lei.

Ao examinar o novo projeto de lei no que tange a distribuição de vagas em instituições de ensino superior públicas nota-se, cristalinamente e indubitavelmente, o tamanho menoscabo do nosso atual governo – na verdade uma prorrogação dos anteriores já que a situação não é nova e sim piorada a cada dia - face a educação brasileira.
O novo projeto, com proposta já aprovada pela Câmara, disponibiliza 50% da vagas a estudantes de escolas publicas. Devem obedecer a proporção de negros, índios e pardos em cada estado. Deste total, metade dos alunos deve ter renda familiar de até um salário mínimo e meio por pessoa. Segundo o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) “a cota que tem que ser estabelecida é a cota social para estudante pobre. Estudante pobre branco, estudante pobre negro, estudante pobre pardo. Ai, nós vamos construir uma democracia no Brasil.”
Pasmo mais a cada dia pela discrepância exacerbada que vem invadindo o território da competitividade e, ainda mais, da igualdade. Conseqüente ausência de vagas no ensino para aqueles que realmente se dedicam estudando por meses e até por anos para conseguir conquistar seu objetivo.
É cada vez mais obvio o fato de que não há interesse no desenvolvimento educacional do povo brasileiro.
Não tento aqui causar uma maior discriminação com relação a raça negra ou outras raças, nem mesmo quanto a capacidade econômica. Muito pelo contrário. Reconheço que existe sim discriminação mas que, ao contrário do que dizem alguns governantes, não é necessária uma discriminação para combater as injustiças.
Tal modificação caracterizada pela sanção de referido projeto só causaria uma discriminação ainda maior. Segundo o sociólogo Demétrio Magnoli, especialista em educação “é preciso tirar a raça da lei. Cotas para as escolas publicas é um remendo inevitável que deveria existir por um tempo curto, enquanto o país faz um grande esforço para melhorar o nível das escolas públicas, que é o que interessa. Mas isso se pode aceitar: cota para escolas publicas, raça não”. Me parece bastante absurda e equivocada as palavras de Willian Douglas, professor da Educafro ao dizer “precisamos discrimina para consertar. Porque se a gente tratar o negro igualmente, a gente não vai mudar essa realidade”.
Na verdade o correto seria nem para raça nem para pobres. Não se resolve um problema criando outro. Se assim for feito, em não muito tempo teremos regiões habitadas por brancos e regiões habitadas por negros, ônibus para brancos, ônibus para negros e ônibus para pardos. Não temos que promover uma separação maior do que a já existente e sim a integralização.
Especificamente quanto aos vestibulares existe uma medida, bastante obvia até, que já deveria ter sido aplicada a muito tempo. Quando se preenche uma ficha para prestar um vestibular muitas são as informações solicitadas. Muito me agradaria de entender qual a necessidade da instituição de saber, nessa fase dados como renda da pessoa e renda familiar, raça, ou até mesmo se vive em casa própria, como solicitado por muitas universidades. O proibido deveria ser a solicitação de tais informações neste momento. Não deveria ser mencionado nem a instituição em que concluiu o ensino médio, por total desnecessidade. Após a aprovação no vestibular é que deveria ser exigida a documentação comprobatória do ensino anterior e nada mais. O aluno deveria apresentar, no momento da prova, somente o estritamente necessário, qual seja, um documento de identificação válido, para que não seja possível a realização da prova por outra pessoa em seu lugar. O que deve se buscar é a veracidade quanto a pessoa que está realizando a prova.
De tal forma não proporcionaríamos ainda mais a discriminação e, teríamos sim, uma competição justa e honesta. Aliás, como bem salienta o cientista político Bolívar Lamounier “quando se reservam vagas, quando se subtrai algumas vagas para competidores, eles não estão mais em igualdade de condição e, conseqüentemente, a lei e a Constituição estão sendo flagrantemente violadas”.
Quanto aos deficientes físicos, estes sim necessitam de vagas especiais, pelo único motivo de que necessitam de uma prova especial, que deverá ser verificada pela instituição para a confecção de prova especial.
Quanto aos mais carentes a solução também é bastante clara. Não temos que determinar vagas especiais mas, sim, um ensino público médio e fundamental de qualidade. Aliás, ao que me parece, o ensino médio e fundamental em nosso país vem se definhando cada dia mais. Isso sim é inaceitável e repugnante.
Enquanto continuarmos a tentar resolver os problemas do país sempre com medidas emergenciais de inopino, nunca faremos um país melhor todavia e tão-somente com mais remendos.
Com medidas simples e, vale dizer, garantidas constitucionalmente, proporcionaríamos uma igualdade de tratamento ao povo brasileiro, aplicando, portanto, a justiça e não uma maior discriminação.

Marcia de Oliveira Souza

Homicídios no Município de São Paulo

Homicídios no Município de São Paulo: integrando informações para
ampliar o conhecimento do problema
.

Vilma Pinheiro Gawryszewski, Túlio Kahn, Maria Helena Prado de Mello Jorge

Introdução
O aumento das violências é hoje considerado um fenômeno global. Em 1996 a Organização
Mundial de Saúde declarou a violência como um importante problema de saúde pública
e, em outubro de 2003, publicou um relatório sobre violência e saúde com dados de vários
países do mundo15. Esse documento mostra que a questão dos homicídios é particularmente
grave na região das Américas, uma vez que os três países com maiores taxas de mortalidade
por homicídios, a partir dos dados estimados para o ano 2000, são a Colômbia, El Salvador
e Brasil (em ordem decrescente).
A análise dos dados para a população do Brasil, provenientes do Sistema de Informações
de Mortalidade do Ministério da Saúde mostra que, no ano 2000, 38,3% das mortes por
causas externas foram devidas aos homicídios13. Esse percentual tende a ser ainda mais alto
nos grandes centros urbanos brasileiros. Nesse aspecto, o Município de S. Paulo, o maior
centro urbano do país, pode ser considerado um bom exemplo, pois no ano de 2001, as
mortes por homicídios representaram 62,4% do total de óbitos por causas externas.
A fonte de dados utilizada usualmente para estudar os homicídios é a Declaração de
Óbito que, a despeito de fornecer informações importantes, carecem de dados sobre as
circunstâncias do evento e outras características dessas mortes. Para uma melhor orientação
das políticas de prevenção torna-se necessário a sua suplementação com outras fontes de
dados. Nesse sentido, a Organização Mundial de Saúde sugere a integração de informações
das fontes já existentes, como um caminho menos dispendioso de aumentar a conhecimento
acerca do problema, uma vez que podem ser utilizados registros rotineiramente realizados10.
A única experiência desse tipo conhecida entre os países da América Latina é na cidade de
Cali, Colômbia, que considerou este modelo como eficaz e oportuno na implantação de
um sistema para a vigilância epidemiológica dos homicídios4. Recentemente, os Estados
Unidos da América estabeleceu um sistema de informações para acompanhar as mortes
violentas naquele país por meio da integração dos dados provenientes das estatísticas vitais,
laudos de necropsia, registros policiais ou da Justiça o National Violent Deaths Reporting
System14.
Considerou-se importante verificar se uma proposta desse tipo poderia ser viável em uma
das grandes cidades brasileiras e quais seriam os ganhos obtidos com tal integração, uma
vez que os Estados Unidos da América é um país que dispõe de muito mais recursos para
implantação de sistemas de informações e a cidade de Cali, embora com altos coeficientes,
tem os números absolutos de homicídios menores4 que os encontrados nas principais
Capitais brasileiras13. O presente trabalho é um estudo que busca conhecer as informações
adicionais acerca da mortalidade por homicídios no Município de São Paulo que podem
ser obtidas a partir da integração dos dados das Declarações de Óbito, laudos de necropsia
e Boletins de Ocorrência Policial.
1
Material e método
As Declarações de Óbito foram consideradas a fonte primária dos dados, enquanto os laudos
de necropsia e Boletins de Ocorrências foram classificados como fontes suplementares. O
banco de dados primário, contendo o universo de homicídios ocorridos no Município de
São Paulo entre seus residentes, foi disponibilizado pelo Programa de Aprimoramento
das Informações de Mortalidade do Município de São Paulo (PRO-AIM). Não foram
incluídos os óbitos ocorridos em outros municípios. O critério de seleção do banco
obedeceu à Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde,
Décima Revisão, no qual os homicídios e agressões encontram-se classificados no Capítulo
XX sob os códigos X85 a Y09. A estes foram acrescidas as chamadas intervenções legais e
operações de guerra, codificadas entre Y35 a Y36.
Para proceder à suplementação de dados, foram selecionados os 2.844 homicídios ocorridos
no segundo semestre de 2001. Foram encontrados 2.714 laudos de necropsia no Instituto
Médico Legal correspondentes à esses óbitos (95,4% do total). As perdas podem ser
devidas ao fato do laudo estar em fase de elaboração, uma vez que alguns deles dependem
de exames mais demorados, ou por ter sido requisitado por familiares, advogados, entre
outros. A partir do número do Boletim de Ocorrência, Distrito Policial e Ano da ocorrência,
foi possível integrar o banco de dados com a base da Secretaria Estadual de Segurança
Pública (Infocrim), permitindo a análise de outras variáveis relevantes, como data e hora
da ocorrência, classificação jurídica das mortes, local da ocorrência e outras informações
cruciais para a compreensão do fenômeno. Foram encontrados 2.617 BOs, 92,0% do total
de mortes registradas no banco de dados primário.
As variáveis estudadas foram sexo, idade, meio de perpetração das mortes, uso de substâncias
psicoativas, natureza da lesão, assistência médica, data, horário e local da ocorrência. Essas
informações foram analisadas sob a forma de números absolutos, proporções e coeficientes.
Para a verificação de diferenças estatísticas foi utilizado o teste do Qui-quadrado de
Pearson. Para a construção de taxas foram utilizadas as estimativas da Secretaria Municipal
do Planejamento (SEMPLA/DEINFO)6, com base no crescimento demográfico entre os
Censos de 1991 e 2000.
Resultados obtidos a partir da coleta de dados
Em relação à distribuição por sexo e idade das vítimas, optou-se por apresentar análise
referente ao universo dos 6.018 homicídios ocorridos em 2001. As demais análises referemse
às mortes ocorridas no segundo semestre de 2001, para as quais procedeu-se à integração
dos dados provenientes das diferentes fontes.
1) Sexo e idade
Observou-se a predominância acentuada do sexo masculino, com 93,2% do total dessas
mortes. Os valores dos coeficientes de mortalidade (por 100.000 habitantes) são altos: 57,2
para o total da população; 111,1 para o sexo masculino e 7,4 para o feminino. A razão de
2
risco para o sexo masculino é 15,4 vezes o feminino.
A idade que apresentou o maior número de óbitos (moda) foi 19 anos. Mais da metade
dessas vítimas é formada por adolescentes e adultos jovens do sexo masculino, visto que os
homens na faixa de 15 a 29 anos concentram 56,0% do total dos homicídios. Decorrente
disso, os coeficientes nessa população chegam a valores muitos altos, com pico no grupo
de 20 aos 24 anos, com taxas atingindo 262,8/100.000; seguindo-se o de 25 aos 29 anos,
226,8/100.000 e 15 aos 19 anos, 205,4/100.000. A Figura 1 mostra a distribuição desses
coeficientes segundo sexo e faixa etária.
Embora com coeficientes bem menores que os homens (para todos grupos de idade), a
mulher que morre vítima de homicídio, também é, na maioria dos casos, jovem. O sexo
feminino apresenta os coeficientes e as proporções distribuídos de maneira próxima àquela
encontrada para o sexo masculino.
2) Os homicídios segundo o meio utilizado
Foram realizadas análises desses homicídios segundo o meio utilizado a partir das
informações constantes nas Declarações de Óbito e também nos laudos de necropsia. A
Tabela 1 compara os resultados obtidos nessas duas fontes.
Em ambas as fontes as armas de fogo causam a maior parte dessas mortes: 66,5% nas
Declarações de Óbito e 88,6% nos laudos de necropsia (essa proporção chega a 89,6%,
quando são somadas as mortes em que foram utilizados múltiplos meios). Os meios não
especificados que ocupam o segundo lugar a partir das Declarações de Óbito (22,6%),
representam somente 0,6% na pesquisa aos laudos. Nessa última fonte, os objetos cortantes
e penetrantes participam com 5,0% do total e as agressões corporais e agressões por objetos
contundentes, entre os quais encontram-se os espancamentos, chegam a 3,5%.
Analisando o uso das armas de fogo exclusivamente a partir dos dados dos laudos de
necropsia, considerado o padrão ouro para essa informação, observou-se que a sua utilização
varia segundo o sexo: os homens mostram proporções mais altas (89,3%) que as mulheres
(77,8%). Essa diferença mostrou-se estatisticamente significativa (X2=18,9;α=5%).
Também foram observadas variações segundo a faixa etária, com maior preponderância
entre os adolescentes e adultos jovens. A faixa de 15 e 29 anos exibe a proporção mais alta,
91,3%; seguem-se os indivíduos com 30 a 44 anos, 88,4%. Os percentuais mais baixos
foram encontrados entre as vítimas com idades entre 0 e 14 anos (74,1%) e nas idades mais
velhas. Entre os 67 casos com idade ignorada, que foram excluídos dessa análise, o uso de
armas de fogo apresenta proporções menores que a média (67,2%), enquanto as mortes por
objeto cortante e penetrante chegam a 19,0%, valor mais alto que a média.
3) Localização anatômica das lesões
Nas mortes violentas, enquanto a causa básica é uma informação fundamental para a
orientação de medidas preventivas, o conhecimento da natureza da lesão é igualmente
3
importante para orientar o planejamento e organização dos serviços de saúde, que devem
alocar recursos e profissionais para o atendimento das vítimas para as quais a prevenção
não logrou êxito.
As informações acerca da natureza da lesão a partir das Declarações de Óbito, geralmente
não são utilizadas, por serem consideradas de baixa qualidade. A pesquisa aos laudos de
necropsia permite obter informação fidedigna. Devido ao percentual elevado de mortes
decorrentes de armas de fogo, optou-se por apresentar somente os dados referentes às lesões
produzidas por esse tipo de arma. Além disso, dado que fica difícil saber, dentre todas as
lesões descritas qual a que levou à morte, optou-se por apresentar a localização anatômica
das lesões nas 2.405 vítimas de arma de fogo.
A média de projéteis por vítima é alta: 6,9. A cabeça foi o local anatômico mais
freqüentemente atingido, 68,9%, com uma média de 3,0 projéteis por vítima. Sabe-se que
os traumas cranianos determinam mortalidade alta, mesmo em situação de serviço de saúde
especializado. Segue-se a região dorsal, que concentrou 44,4% do total de lesões, com uma
média de projéteis de 2,8. Em terceiro lugar, encontra-se o tórax, respondendo por 41,0% das
lesões, cuja média de tiros foi 2,6. Por certo, esses dados permitem outras formas de análise,
aqui o denominador foi o número de vítimas e o numerador os segmentos corpóreos.
4) Assistência médica:
Em relação à avaliação se houve assistência médica às vítimas, pretendia-se comparar o
dado existente na Declaração de Óbito com aquela coletada nos laudos de necropsia. A
análise dessa informação a partir da DO mostrou que para a maioria desses óbitos (66,0%),
os pacientes foram transportados para o hospital, não significando obrigatoriamente, que
os indivíduos tenham chegado a receber algum tipo de assistência. Porém, o número de
mortes ocorridas em via pública foi muito baixo (0,1%), o que se mostrou contraditório
com a informação de anos anteriores, em estudos nessa mesma fonte7, por isso esse dado
não foi analisado.
Em virtude das armas de fogo serem o principal instrumento para a execução do homicídio,
a hipótese inicial era de que a maior parte destas vítimas, não se beneficia da assistência
médica, o que se confirmou com a análise dos laudos de necropsia, onde consta que 43,7%
(1187 vítimas) chegaram a ser encaminhadas para hospitais. Os hospitais que receberam
o maior número de vítimas de homicídios no segundo semestre de 2001, a partir da
informação dos laudos de necropsia, foram aqueles localizados nas zonas sul e leste do
Município, coincidindo com as regiões que apresentam coeficientes de mortalidade mais
altos para essas causas.
5) Uso de álcool e outras substâncias psicoativas
Os dados apresentados na Tabela 2 dizem respeito ao uso de substâncias psicoativas nas
vítimas de homicídios. De um total de 2.714 laudos examinados, o exame toxicológico não
foi solicitado para 1.492 vítimas (55,0%). Entre aquelas que tiveram o exame solicitado, para
um pouco mais que a metade (55,8%) o resultado foi negativo. O álcool foi a substância
4
mais utilizada entre estas vítimas (42,5%). O uso de cocaína sozinha, ou associada ao álcool
apresentou percentuais muito baixos (0,7%).
Visto não ser conhecido o critério para solicitação de exame, esses percentuais não devem
ser generalizados para o conjunto das vítimas. Feita essa ressalva, os resultados mostrados
a seguir dizem respeito somente às vítimas que tiveram o exame solicitado. O exame
toxicológico é provavelmente solicitado quando a autoridade policial suspeita do uso de
substância pela vítima, o que pode elevar os percentuais encontrados.
Foi encontrada maior proporção de consumo de álcool no sexo masculino, 44,0%,
enquanto nas mulheres foi de 24,0%. Os cálculos realizados mostraram que essa diferença
é estatisticamente significativa (X2=10,4; α=5%). Em relação à faixa etária das vítimas de
homicídios que tiveram o exame toxicológico realizado pelo IML, observa-se que nas idades
mais jovens e mais velhas, o percentual de resultados positivos para o álcool é menor que
a proporção da média. Porém, nas faixas mais velhas tanto o número absoluto de vítimas
quanto o percentual de exames solicitados são menores. A faixa de 30 a 44 anos apresenta
51,2% de positividade para o álcool entre as vítimas. Seguem-se os de 45 a 59 anos com
47,2%.
A análise do consumo de álcool (excluídos aqueles cujo exame não foi solicitado) segundo o
meio utilizado para a perpetração dos homicídios também mostrou diferenças. Entre aqueles
cometidos por arma de fogo, 41,0% das vítimas tinham feito uso de álcool, enquanto para
os outros meios (arma branca, objeto contundente etc), esse percentual é maior, chegando
a 58,9% (Figura 2). Essa diferença mostrou-se estatisticamente significativa
(X2=16,5; α=5%).
6) Dia e horário da semana
A análise dos dados do Boletim de Ocorrência, onde consta o dia e horário da ocorrência,
verificou-se que os dias da semana que apresentaram maior proporção dessas ocorrências
correspondem aos finais de semana, concentrando 50,0% do total de casos: sábado (500
vítimas), domingo (462) e sexta feira (348). A quarta feira é o dia com menor número de
vítimas (233). É durante a noite e madrugada que a maior parte desses crimes ocorreram
(entre 19:00 horas e 1:00 foram registrados 41,1% dos eventos). Essa fonte também
possibilitou o conhecimento do local de ocorrência do evento, tendo sido verificada a
coincidência entre local de residência da vítima e local de ocorrência do crime para 50,6%
das vítimas. Para 24,0% dos óbitos essas localidades eram próximas e para 17,3% deles, os
locais de residência e ocorrência eram diferentes.
Discussão
Entre as limitações do estudo, que devem ser apontadas, está a dificuldade de estabelecer se
as vítimas que foram transportadas até os hospitais chegaram a receber alguma assistência
médica nesses locais, uma vez que nos laudos de necropsia consta o nome do hospital de
procedência do corpo, mas só são descritas as intervenções maiores tais como traqueostomias
ou incisões cirúrgicas. Ainda assim, essa é uma informação fundamental de ser quantificada,
5
na medida em que é possível conhecer quais são os hospitais com maior demanda para estas
vítimas e, conseqüentemente, planejar ações para melhorar o atendimento neles realizado.
Uma outra limitação diz respeito aos resultados acerca do uso de álcool e outras substâncias
psicoativas, pois esses exames são realizados pelo Instituto Médico Legal, somente quando
há solicitação das Delegacias Policias responsáveis pela área ou pelos próprios médicos
legistas. Portanto, os percentuais encontrados percentuais não devem ser generalizados
para o conjunto das vítimas, visto não ser conhecido o critério que norteia essa seleção.
Em relação à mortalidade por causas externas é comum apontar que as faixas mais jovens
são preferencialmente atingidas; no entanto, essa tendência é mais pronunciada entre os
homicídios quando comparados às vítimas fatais de acidentes de transporte, suicídios e
quedas7. Embora generalizada, a violência tem elegido os jovens das regiões metropolitanas
como alvo e instrumento preferencial, atingindo as pessoas no início de sua vida produtiva.
Essas perdas precoces de vidas já apresentam reflexos na expectativa de vida da população.
Além disso, os coeficientes encontrados são altos. Na cidade de Los Angeles, considerada
nos Estados Unidos como um local com altos índices de homicídios, o coeficiente de
mortalidade por essa causa, no ano de 1996, para a população geral, foi 14,0/100.000. No
entanto, quando se considera o grupo afro-americano do sexo masculino com idade entre
15 a 34 anos, a taxa chega a 164,2/100.0008, valor bem menor que o observado nos homens
residentes na cidade de S. Paulo, nesta mesma faixa etária, que alcança 222,7/100.000.
O percentual de uso de armas de fogo é consistente com dados de anos anteriores para o
Município de São Paulo7 e para o Recife7, que mostram percentuais maiores que 90% entre
os homicídios. Essas armas são reconhecidamente mais prováveis de resultar em morte do
que qualquer outra, sendo fortes aliadas do aumento da violência (tanto nos homicídios,
quanto nos suicídios) e acidentes.
A despeito da reconhecida questão cultural que envolve a posse de armas na sociedade
americana, elas foram responsáveis por 64,7% das mortes por homicídios, no ano de
2000 nos Estados Unidos da América2. Em Cali, Colômbia, cidade que apresenta taxa de
mortalidade por homicídios mais alta que a verificada no presente estudo, o percentual de
uso de armas de fogo também é menor, tendo variado entre 79,3% a 84% entre os anos de
1993 e 19984. Tais dados apontam a gravidade desse problema na sociedade brasileira, que
a própria área da saúde conhece e discute ainda pouco.
Considera-se que arma de fogo e álcool são fatores criminógenos, na presença dos quais, num
contexto previamente conflitivo, a violência é exponenciada. Porém, as armas de fogo são
somente um meio para a perpetração do crime, pois outros fatores devem estar envolvidos.
Costa3 aponta que, embora em Israel e na Suíça a população tenha acesso a essas armas,
as taxas de homicídio não são altas. Por isso aponta-se a necessidade da realização de mais
estudos para elucidar os fatores ligados ao uso de armas de fogo em nosso meio.
A intenção de produzir a morte fica evidente ao se verificar a média alta de projeteis por
vítima e a grande concentração de ferimentos na área da cabeça (68,9% das vítimas).
Também Falbo6, em estudo realizado no Recife com vítimas de homicídio, mostrou que
6
71% das vítimas haviam sido alvejadas na cabeça. É possível que esse fato tenha contribuído
para que a maioria das vítimas não se beneficiou de assistência médica. Isso aponta que
as medidas para a redução dessa mortalidade devem dar ênfase à prevenção primária. E,
aqueles locais que recebem um maior número de vítimas, devem ter uma melhor alocação
de recursos humanos e materiais, desenvolvimento de protocolos específicos e capacitação
dos profissionais. Igualmente importante é o estabelecimento de um bom atendimento já
na fase pré-hospitalar.
Chama atenção a alta prevalência de utilização do álcool entre as vítimas de homicídio
que tiveram o exame toxicológico realizado (42,5%) apontando que mais estudos devam
ser realizados para elucidar o papel do álcool na potencialização dos conflitos sociais que
resultam em morte, em nosso meio. Esse resultado é próximo ao encontrado em pesquisa
realizada com vítimas não fatais de agressões atendidas em um importante serviço de
emergência do Município de São Paulo, onde percentual de alcoolemia encontrado foi
46,2%5. O perfil desses pacientes, maior prevalência no sexo masculino e na faixa etária de
25 a 44 anos, também coincide com o encontrado no presente. Os resultados encontrados
em Cali, Colômbia, entre as vítimas de homicídios, são menores, variando entre 13,0 e
23,4%, no período de 1993 a 19984.
Enquanto na literatura nacional ainda são poucos os estudos desenvolvidos nessa área, na
literatura internacional são vários os trabalhos que apontam associação entre o uso de álcool
e comportamentos violentos1;9. Em 1996, a Universidade de Colorado, nos Estados Unidos,
baniu a venda de bebidas alcoólicas em seus estádios de futebol, fazendo cair drasticamente
os registros de incidentes, tais como prisões, assaltos e expulsões do estádio1. Entre 1992
e 1996, foi conduzido um estudo na Califórnia para determinar o efeito de intervenções
na redução das altas taxas de acidentes de carro e agressões, relacionadas ao consumo de
álcool. As intervenções englobaram ações educativas e repressivas, tais como a mobilização
da comunidade, maior responsabilidade nos locais de comércio de bebidas, maior respeito
à idade limitada por lei para o consumo de álcool entre os jovens e a intensificação das
prisões de pessoas que infringiam as leis que regulam o uso dessas bebidas. Os resultados,
provenientes das emergências hospitalares, comparados com comunidades onde não houve
implantação de qualquer medida, mostraram que os acidentes de trânsito declinaram 10%
e as agressões 43%, nas comunidades com intervenção9.
Mas, cabe lembrar que, da mesma forma que as armas de fogo, o álcool atua como um dos
fatores, mas não é a causa das violências. Além disso, o indivíduo sob o seu efeito, pelo
prejuízo na atenção e capacidade de julgamento, pode apresentar maior vulnerabilidade nas
situações de acidentes e violências.
Os resultados encontrados nesse trabalho mostram a viabilidade e utilidade da integração
de informações das estatísticas vitais e laudos de necropsia, que já são rotineiramente
produzidas por órgãos oficiais. A proporção de 95,4% de laudos de necropsia encontrados
foi considerada adequada para as análises realizadas. A vigilância de lesões por arma de fogo
implantada no Estado de Maryland, Estados Unidos da América, encontrou uma proporção
de 92,5% para o mesmo tipo de integração16. A proporção de integração com os Boletins de
Ocorrência Policial também foi considerada satisfatória (92,0% ), resultando em um maior
7
conhecimento do problema, a partir do levantamento de importantes variáveis que não são
conhecidas e/ou usualmente estudadas, além de agregar qualidade aos dados.
As violências vêm se tornando um ônus significativo para as populações de todo o mundo
e diminuir sua morbi-mortalidade é um dos principais desafios para a saúde pública neste
século que se inicia. Embora de grande complexidade, este é um problema que pode ser
compreendido e mudado. Pesquisadores nas últimas duas décadas tem demonstrado que
a violência pode ser prevenida e que, programas de prevenção são mais custo-eficientes
que outras políticas tais como o encarceramento10. Se a população brasileira almeja viver
em uma sociedade menos violenta, é preciso avançar no conhecimento acerca dos fatores
de risco em nosso meio, para poder planejar de uma maneira mais precisa e científica, os
possíveis caminhos de atuação.
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in a global perspective. American Journal of Public Health. February 2003, vol. 92, Nº.
12:256-261.
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Desistência voluntária - Arrependimento Eficaz - Arrependimento Posterior

Desistência voluntária e arrependimento eficaz
Se o sujeito inicia o processo executório, mas desiste de prosseguir evitando a consumação, não há que se falar em tentativa, pois não foi preenchido o requisito “circunstâncias alheias à sua vontade” (o que evitou o resultado foi a própria vontade do agente). Nesse caso, também não pode se falar em punição pelo crime consumado, pois esta não foi alcançada.
O que fazer? Não punir pela falta de previsão legal, além dos limites dos resultados já alcançados. Assim, se o sujeito tinha seis tiros disponíveis, disparou dois e cessou voluntariamente, responderá apenas pela lesão causada. E se não causar nenhuma lesão? Prevalece que por nada responderá, tratando-se de medida de política criminal direcionada a estimular a desistência. A desistência voluntária sem lesão, assim, pela corrente majoritária, torna o fato atípico, pois não é consumado nem tentado. Se houver lesão, será típico apenas em relação aos resultados alcançados. Há posição minoritária no sentido de que seria causa de isenção de pena. A desistência voluntária é regulada no artigo 15 do CP.
Há posição ainda minoritária no sentido de que, no caso dos disparos que não acertaram a vítima, ainda que não tenha sido produzido nenhum resultado lesivo, crimes de perigo foram aperfeiçoados, como o disparo de arma de fogo e ou o perigo para a vida ou saúde de outrem. Assim, o sujeito seria punido, não pelo homicídio consumado ou tentado (pois ali haveria atipicidade), mas sim pelas infrações de perigo que normalmente seriam absorvidas pelos crimes de lesão.
Exemplo clássico de desistência voluntária é presente na obra Dom Casmurro, em que Bentinho oferece a seu filho uma xícara de café envenenado e, assim que esse vai ingerir a bebida, Bentinho recua e coloca a xícara novamente na mesa.
O mesmo raciocínio se aplica ao arrependimento eficaz, com a diferença que, nesta figura, o sujeito já esgotou o processo executório, apenas não tendo ainda atingido a consumação. Toma, então, providências para evitar a referida consumação, com sucesso.
Da mesma forma, o resultado não deixou de ocorrer por circunstâncias alheias a vontade do agente, mas sim por sua vontade, o que afasta tanto a hipótese de crime tentado como consumado. A conseqüência também será a mesma, ou seja, o sujeito apenas responderá pelos resultados já provocados, se existentes.
Na desistência voluntária, podemos entender como melhor critério para compreender como voluntária a atitude do sujeito, o fato dele figurar dono da decisão, ou seja, quando tem liberdade par optar entre o sim e o não na continuidade da conduta. Daí a idéia que a sugestão do terceiro não afasta a voluntariedade, enquanto a aproximação de policiais impede o reconhecimento da desistência voluntária. Famosa a distinção “quero mas não posso (tentativa); posso, mas não quero (desistência voluntária)”.
Diz se que na desistência voluntária e no arrependimento eficaz há uma “ponte de ouro” a ser atravessada pelo agente, com vistas a afastar ou reduzir a pena, para que sejam evitados os resultados lesivos.
Nos dois casos, se apesar da desistência ou das atitudes para evitar a consumação, esta ocorre, o sujeito responde normalmente pelo crime consumado.
A natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz é controversa, sendo que adotamos o critério da atipicidade quanto ao tipo consumado e tentado, culminando no máximo na punição dos resultados já alcançados. Há corrente no sentido de se tratar, não de problema de tipicidade, mas sim de causa dirimente da punibilidade. A diferença de tratamento encontra conseqüências, por exemplo, no caso de concurso de agentes.

Arrependimento posterior
Não há nenhuma relação estrutural com arrependimento eficaz.
Trata-se de uma causa de diminuição de pena para os crimes praticados sem violência ou grave ameaça dolosa à pessoa, nos quais o prejuízo é reparado até o momento do recebimento da denúncia ou da queixa.
A redução é de um a dois terços, e prevalece que a redução será tanto maior quando mais célere a reparação. Tratamos aqui de um velho instituto já preocupado com a nova tendência de resgatar o papel da vítima no conflito penal, estimulando a reparação do dano.
É possível tanto nos crimes dolosos quanto nos culposos.

NA PAUTA DO DIA: A JUSTIÇA ARISTOTÉLICA

NA PAUTA DO DIA: A JUSTIÇA ARISTOTÉLICA


Se Aristóteles estivesse aqui hoje, certamente seria motivo de boa reflexão neste quesito Justiça.
A aplicação da teoria aristotélica seria ideal para acabar com a injustiça no nosso país. Isto porque Aristóteles trata a Justiça como uma virtude, devendo os homens atuar no exercício da virtude para que haja Justiça.

Mas a percepção do filósofo a respeito da sociedade geradora do Estado justo continua sendo utópica, apesar das inúmeras variáveis de justo que apresenta em seus escritos. Isto porque cada vez mais fica evidente que a sociedade tem pouca participação na definição do Estado e da Justiça. A sociedade não detém o poder. No mais das vezes, quando age por meio de seus representantes, dá-se a impressão de total independência e descomprometimento social de seus membros. Ou seja: a sociedade não percebe o nível de coerção e manipulação que sobre ela exercem as lideranças, desejosas exclusivamente de poder. E mais: o Poder Judiciário termina, como legislador negativo, tendo que se conformar a essa realidade, quando, em verdade, deveria aplicar as leis almejando o seu fim social.
Hoje, os governantes fazem o que desejam, tendo como exclusivo limite não a Constituição Brasileira, mas sim a força das articulações políticas dos grandes interesses econômicos.
Nós, como cidadãos, temos o dever de influenciar junto aos nossos governantes, para que se faça Justiça ao invés de injustiça. Neste sentido, Aristóteles diz que o homem é justo ao agir na legalidade, que o homem é virtuoso quando, por disposição de caráter, orienta-se segundo este mesmo vetor, mesmo sem a necessária presença da lei ou conhecimento da mesma.
Em suma, acreditamos que a teoria aristotélica, tendo como finalidade alcançar o Bem -como a felicidade, a liberdade, a igualdade, enfim, a virtude da Justiça- por meio do agir na legalidade, encontra-se na pauta do dia. Mas para isso é preciso, acima de tudo, ter essa prática virtuosa. Somente assim a realização da Justiça em Aristóteles poderá tornar-se instrumental de sabedoria prática humana, principalmente quando guiada pela busca do supremo Bem.


Texto apresentado pela acadêmica Mirian Araújo Gaudêncio - 4º Semestre do Curso de Direito/Uniflor.

Concurso de crimes

Concurso de Crimes

Ocorre quando da pluralidade de crimes.
Ou seja, deve haver mais de um crime para que haja então o concurso.
Insta observar que quando um crime absorve outro não podemos falar em concurso posto que houve apenas um crime.
Para melhor compreensão da matéria necessário se faz o entendimento sobre o termo ação.
Conforme Fragoso[1] ministra-nos sabiamente o ensino, “ ação é a atividade humana conscientemente dirigida a um fim” e, mais adiante “ integra-se através de um comportamento exterior, objetivamente, e, subjetivamente, através do conteúdo psicológico desse comportamento, que é a vontade dirigida a um fim”.
Ação é a “conduta socialmente relevante, dominada ou dominável pela vontade humana” – conforme teoria social trazida por Johannes Wessels.
Ou, conforme Welzel – conceito final, ação é “o exercício de uma atividade final”.


Concurso Material

O concurso material ocorre quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, produz dois ou mais resultados que podem ser idênticos ou não.

Espécies:

Homogêneo - ocorre quando as ações produzem resultados idênticos
Heterogêneo – ocorre quando as ações produzem resultados diferentes

Aplicação da pena:
Ocorrendo concurso material as penas deverão ser somadas.

É o mal do crime, mal da pena.


Concurso Formal

O agente mediante uma só conduta produz dois ou mais resultados, idênticos ou não.


Espécies:

Perfeito ou puro:
Os resultados derivam de um só desígnio (plano, projeto, propósito)

Imperfeito ou impuro:
Os resultados derivam de desígnios autônomos: deve ser sempre doloso.


Há controvérsia se necessário dolo direto ou se basta dolo eventual.

Os crimes praticados em concurso formal também poderão ser classificados em homogêneos e heterogêneos.


Exemplo de concurso formal perfeito:
Motorista de ônibus que tem o desígnio de efetuar a ultrapassagem e resulta na morte de dezenas de pessoas; aberratio ictus com duplo efeito.

Aplicação da pena:

Concurso formal perfeito:
Pena do mais grave acrescida de uma sexto a metade. Este sistema é chamado de exasperação da pena. O aumento varia de acordo com o número de resultados.

Concurso formal imperfeito:
Somam-se as penas.


Crime continuado

Ocorre quando o agente mediante mais de uma ação ou omissão pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro.
Ou seja, é aquele em que o agente comete mais de uma ação ou omissão, mais de um crime da mesma espécie, com condições semelhantes de tempo, lugar, modo.
Um em continuação do outro.
Importante destacar a diferença entre crime continuado e crime habitual. O primeiro diz respeito a prática de mais de um crime, enquanto o outro, segundo lição de Capez[2] é “o composto pela reiteração de atos que revelam um estilo de vida do agente, ... cada ato constitui fato atípico, pois a tipicidade depende da reiteração de um número de atos, no crime continuado cada ato isolado, por si só, já constitui crime”.

Requisitos:
-da mesma espécie: prevalece que no mesmo tipo penal;
-lugar: até cidades próximas são aceitas – dependendo do caso até mesmo de Estados diferentes, levando-se em conta a proximidade.
-tempo: prevalece que o intervalo entre os crimes poderá ser de no máximo trinta dias.
-modos de execução – analisar comparsas, armas, qualificadoras, etc.

O código penal brasileiro adotou a teoria objetiva pura. Isto quer dizer que, quando reconhecidos os requisitos objetivos descritos, a continuidade delitiva deve ser declarada.

Sistema de exasperação das penas:
Aplica-se a pena de um dos crimes aumentada de um sexto a dois terços.

Crime continuado específico ou qualificado:
É o continuado aplicado nos delitos dolosos cometidos com violência ou grave ameaça contra a pessoa.
Aplicação da pena: pena maior aumentada até o triplo.
É o que trata o §único do artigo 71 do mesmo codex.

Concurso material benéfico:

Se a aplicação da regra do crime continuado, do crime continuado específico ou do concurso formal perfeito tornar a pena maior do que a resultante da soma, terá a aplicação da regra do concurso material, em benefício do agente.


Pena de multa no concurso de crimes

No concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente.
Em conformidade com o artigo 72 do Código Penal, no caso de concurso de crimes as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente, ou seja, devem sempre ser somadas e nunca exasperadas.

[1] Fragoso, Heleno Cláudio. Lições de direito penal. Parte geral. 4ª edição Rio de Janeiro; Editora Forense, 1980.
[2] Capez, Fernando. Curso de direito penal. Parte Geral. Volume 1. 10ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2006

Regimes de cumprimento da pena - Progressão e Regressão do Regime

Regimes de Cumprimento de Pena
São três os regimes admitidos no Brasil, sendo eles regime fechado, semi-aberto e aberto.

A. Regime fechado
É aquele que deverá ser cumprido em penitenciária.
Segundo o artigo 33, parágrafo primeiro, alínea a, considera-se regime fechado “a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média”.
A lei de Execução Penal prevê ainda celas individualizadas em seu artigo 88: “O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório”.
Ademais, são requisitos básicos da unidade celular a salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana além de uma área mínima de 6m² (seis metros quadrados).

B. Regime semi-aberto
Regime semi-aberto é a execução da pena em prisão agrícola, industrial ou estabelecimento similar.
São requisitos básicos das dependências coletivas a seleção adequada dos presos e, ainda, o limite de capacidade máxima que atenda os objetivos de individualização da pena.

C. Regime aberto
Neste regime há recolhimento noturno e aos finais de semana, devendo o apenado se recolher na Casa do Albergado ou estabelecimento adequado.
Exceção quanto aos maiores de setenta anos e os que possuem doença grave, bem como a gestante e as mães de filho doente ou incapaz, casos em que poderão cumprir em regime aberto domiciliar. Ocorre que, como praticamente não existe Casa do Albergado, na maioria dos Estados, a exceção acaba sendo regra, já que não se pode punir com pena maior do que a estabelecida, ou seja, na maior parte das vezes, o apenado acaba por cumprir pena de regime aberto domiciliar.
A casa do albergado deverá situar-se em centro urbano, separado dos demais estabelecimentos, e caracterizar-se pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga, além disso, deverá conter além dos aposentos para acomodar os presos, local adequado para cursos e palestras e, ainda, instalações para os serviços de fiscalização e orientação dos condenados.

Fixação de Regime Inicial
O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, as penas aplicáveis dentre as cominadas, a quantidade de pena aplicável – dentro dos limites previstos -, o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e a substituição da pena privativa de liberdade aplicada – por outra espécie de pena – se cabível.

Progressão e Regressão do Regime de Cumprimento de Pena
Insta esclarecer que, a progressão de regimes não serve para beneficiar o preso apenas e, sim, para testá-lo.
A grande maioria dos leigos imagina ser a progressão de regimes mais um desvio legal para colocar mais rápido criminosos nas ruas, como se fosse uma forma pela qual o condenado se esquivaria da pena.
Quando as pessoas, de um modo geral, perceberem que soltar de uma vez condenado preso em regime fechado por muito tempo, não pode ter tanta vantagem assim, a legislação poderá ser melhor compreendida.
Não é questão de soltá-lo mas, sim, de reintegrá-lo a sociedade proporcionando maior segurança para a mesma.

Pena e suas aplicações

Penas e suas aplicações

3.1 Origem
A palavra pena surge do latim havendo, contudo, divergência acerca da palavra que a originou, dentre elas “pondus” e “poena”.
“poena” tem como significado pena ou castigo, enquanto “pondus” tem como significado peso, o que lembra a balança da justiça que equilibra os dois pratos.
Alguns doutrinadores sustentam ainda que a palavra pena tem origem grega, vinda de “ponos”, que é trabalho, fadiga e, outros ainda, crêem que se originou do sânscrito “punya” que significa pureza, virtude.
Quanto a este último entendimento devemos lembrar que Platão e Roeder julgavam a pena um bem.
Segundo J.M. Othon Sidou[1], pena é a punição imposta pelo Estado ao autor de crime ou contravenção, em resultado da ação penal.
Pena, pode-se dizer hoje, que é o direito de punir do Estado.

3.2 Finalidade
Antes mesmo de fixar os direitos, as leis impuseram, aos juizes e legisladores a aplicação das penas.
É para o bem da sociedade e, em conformidade com o tempo e espaço, para garantir a ordem, que se aplicam as penas, em função da sociedade.

É aplicada para que haja uma organização, aos que recusam obediência, como um sentimento de defesa pois, quando inexistente, a humanidade se remete a um sentimento individual e desorganizado, agindo com total indisciplina, surgindo a vingança individual e, por vezes, excessiva, o que sem dúvida prejudica todo o grupo, pela inexistência de autoridade e consciência.
Temos hoje diversos princípios constitucionais e de direito penal que cuidam dos excessos, que limitam as penas, nos dizendo ainda quando devem ser aplicadas.
A Constituição Federal de 1988 nos traz em seu artigo 5º, inciso LXVI, limites quanto à forma de se penalizar, trazendo as penas cabíveis em nossa sociedade, proibindo outras que não as estipuladas nesta norma, excetuando casos especiais devidamente expressos também em lei.

3.3 Evolução
A norma jurídica é composta por dois elementos principais – Preceito (previsão da conduta criminosa) e Sanção (cominação da pena) – Sendo aquele uma orientação do Estado indicando o que se deve ou não se deve fazer, enquanto esta é a punição a ser aplicada a todos aqueles que infringirem o preceito. Toda vez que um indivíduo pratica um ilícito penal (ofende um preceito), existe uma retribuição à tal conduta, impondo ao agente uma pena (uma sanção), em função do ato praticado.
Em tempos remotos, o direito de punir pertencia não somente ao Estado, mas como também a cada cidadão que tivesse um direito agredido, como ocorria na Mesopotâmia (Código de Hamurabi), entre os hebreus (Deuteronômio de Moisés), ou atualmente entre os fundamentalistas islâmicos, permitindo que o próprio agredido efetue a satisfação do seu direito frente ao agressor. Entretanto, com a evolução das sociedades, tornou-se evidente que o único ente capaz de punir seria o Estado, uma vez que, se é o Estado que desenvolve a norma, deve ele, e somente ele, aplicá-la.
Podemos também afirmar que, atualmente, a pena aplicada ao indivíduo que praticou um ato ilícito pode objetivar várias finalidades: A pena imposta ao condenado visa, ao mesmo tempo puní-lo pelo ato que cometeu, reeducá-lo, de modo que possa ser reintegrado à sociedade e que não cometa tais atos novamente, servindo, portanto, de exemplo para que nenhum outro indivíduo persiga o caminho percorrido por este cidadão, além de proteger a sociedade, de modo que o Estado, único titular do direito de punir, aprisione qualquer elemento capaz de desestabilizar o a paz pública e o bem comum.
Portanto, para que a pena imposta pelo estado alcance todas as finalidades, esta deve estar revestida de notável discrição, a ponto de que ela cumpra o seu papel sem precisar ser injusta, desnecessária ou cruel. Deste modo, o ser humano, ao longo de sua evolução, chegou à conclusão de que "enjaular" um indivíduo, açoitá-lo e submetê-lo a penas extremamente severas não era o suficiente para reduzir os delitos – O sistema de "vingança institucionalizada" não produzira os efeitos desejados.
Isso vem sendo discutido desde épocas mais remotas, como evidencia MONTESQUIEU em sua singular obra, "O Espírito das Leis":
"Os homens não precisam, absolutamente, ser levados pelos caminhos extremos; deve-se procurar os meios que a natureza nos oferece para os conduzir."

(...)
"É, entre nós, um grande erro aplicar o mesmo castigo ao que assalta estradas e ao que rouba e assassina. É evidente, para a segurança pública, que se deveria estabelecer alguma diferença na pena"
Mesma concepção tem BECCARIA, conforme aduz de maneira esplêndida em seu texto "Dos Delitos e das Penas:"
"Os castigos têm por finalidade única obstar o culpado de tornar-se futuramente prejudicial à sociedade e afastar os seus concidadãos do caminho do crime."
Em outro momento, o autor descreve as perigosas conseqüências que poderão vir à tona caso as penas sejam impostas de maneira desproporcional. Vejamos:
"Quanto mais terríveis forem os castigos, tanto mais cheio de audácia será o culpado em evitá-los. Praticará novos crimes, para subtrair-se à pena que mereceu pelo primeiro."
É fato. O tratamento carcerário oferecido a uma grande parcela dos condenados é indubitavelmente inadequado, o resultado produzido pela privação da liberdade a eles não é o esperado pela sociedade, a construção e a manutenção de estabelecimentos penais adequados ao cumprimento de tais penas exigem gigantescos recursos que poderiam ser aplicados em aparelhos que melhor serviriam à população, tais como escolas e hospitais, e, no que diz respeito a infratores primários, ocasionais ou responsáveis por delitos de pequena significação, a situação é ainda mais grave
Tal ambiente permite a estes cidadãos que pouco risco oferecem à sociedade, a se sujeitarem, na intimidade do cárcere, à sevícias, corrupção e perda paulatina da aptidão para o trabalho, sem falar do abominável estigma que a eles serão embutidos pela sociedade que procura se manter distante dos "ex-presidiários".
Outrossim, a inevitável convivência com criminosos de toda espécie desvaloriza de maneira substancial sua personalidade. Tal convivência, naturalmente, não somente afeta a índole daquele que a priori era passível de recuperação, como também facilita o surgimento, nas prisões, de organizações criminosas altamente perigosas para a ordem pública.
A partir deste raciocínio, juristas, sociólogos, cientistas políticos e a sociedade, como um todo, buscam soluções alternativas para os infratores que não colocam em risco a paz e a segurança da sociedade. Dessa maneira, com a proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Organização das Nações Unidas procurou reconhecer a dignidade inerente a todos os membros da família humana, que é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.
O Pacto Internacional dos Direitos Políticos e Civis e a Declaração Universal dos Direitos do Homem vieram consubstanciar as experiências das Nações Unidas no terreno da implantação, execução e fiscalização das medidas alternativas à pena privativa de liberdade.
No Sétimo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e Tratamento dos Delinqüentes expediu-se a Resolução 16, enfatizando a necessidade da redução do número de reclusos, de soluções alternativas à prisão e da reinserção social dos delinqüentes.
Coube, em seguida, em 1986, ao Instituto Regional das Nações Unidas da Ásia e do Extremo Oriente para a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente, formular os primeiros estudos relacionados com o assunto. Foram então redigidas as Regras Mínimas para a Elaboração de Medidas não Privativas de Liberdade, e o 8º Congresso da ONU recomendou a sua adoção, que ocorreu em 14 de dezembro de 1990, pela Resolução 45/110, da Assembléia Geral.
Aprovou-se, ademais, na mesma ocasião, a recomendação de denominá-las Regras de Tóquio.

3.4 Espécies
São três as espécies de penas permitidas por nosso sistema:
I – Pena restritiva de direitos;
II – Multa;
III -Pena privativa de liberdade;

Pena restritiva de direito
Elencadas nos incisos do artigo 43 do Código Penal, são elas a prestação pecuniária (I), a perda de bens e valores (II), a prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas (IV), a interdição temporária de direitos (V) e a limitação de fim de semana (VI).
Esta relação de substitutivos penais deve ser interpretada de maneira exaustiva, isso quer dizer que, inexistente qualquer pena restritiva de direitos senão aquelas dispostas nos incisos do artigo 43 do Código Penal. Qualquer decisão que condene o réu a pena alternativa diversa àquelas dispostas no artigo anteriormente referido estará eivada de nulidade.


Prestação de serviços à comunidade
Para penas superiores a seis meses de privação de liberdade.
O sujeito prestará serviço gratuito à comunidade à razão de 1 hora por dia de condenação.
Exemplo: limpar banheiro público.
A prestação de serviços à comunidade tem como escopo fazer com que o condenado retribua à sociedade os danos que provocou, reinserido nesta sem os estigmas que seriam absorvidos por uma pena privativa de liberdade de curta duração. Não se pode comparar esta modalidade de pena com a pena de trabalhos forçados, explicitamente vedada em nossa Carta Maior. Na pena inserida pelo artigo 46 do Código Penal, a gratuidade dos serviços, tem caráter retributivo, é imposta por tempo limitado, e será observada as aptidões do condenado, de maneira que o serviço a ser prestado seja semelhante à sua atividade exercida habitualmente, sem que seu trabalho seja prejudicado. Ao contrário da pena de trabalhos forçados, onde os indivíduos são condenados penas perpétuas e a exercer atividades penosas.
A prestação de serviços à comunidade trata-se de uma pena restritiva de direitos onde o apenado, condenado a uma pena privativa de liberdade superior a 6 meses, efetuará gratuitamente tarefas em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais.
Quis o legislador que a prestação de serviços à comunidade seja aplicada somente para aqueles cuja pena privativa de liberdade seja superior a 6 (seis) meses pelo seguinte motivo: Ao ser encaminhado à uma instituição, para cumprir sua pena, o condenado não começa exercendo de pronto as tarefas à ele incumbidas. Ele passa por todo um processo de adaptação, de preparo e de treinamento, para que possa cumprir a função a ele imposta pelo Estado. Logo, pouco frutífera seria a prestação de serviços à comunidade do condenado a dois meses de detenção, por exemplo, uma vez que ele passaria a maior parte da sua pena se submetendo a treinamentos do que ao exercício de sua tarefa propriamente dita.
Compete ao juiz da execução designar qual entidade o sentenciado deverá executar as suas tarefas, como expõe o art. 149 da Lei de Execuções Penais.
Ademais, o artigo 150 do mesmo texto indica que a entidade beneficiada com a prestação de serviços encaminhará mensalmente, ao juiz da execução, relatório circunstanciado das atividades do condenado, bem como, a qualquer momento, comunicação sobre ausência ou falta disciplinar.
O Disposto na Lei 7.210/84 §1º foi tacitamente revogado pela lei 9.714/98. Antes do advento desta lei, dispunha a L.E.P., que a duração do trabalho seria de 8 (oito) horas semanais. Atualmente, o apenado cumpre uma hora de trabalho para cada dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho. Pois, pouco adiantaria ele trabalhar de maneira gratuita em detrimento de um trabalho remunerado, cujo salário seria necessário para o sustento próprio e de sua família. Ademais, permite a lei que esta prestação seja cumprida em período inferior à cominação da pena privativa de liberdade, desde que a pena substituída seja superior a 1 (hum) ano, e que a prestação não seja efetuada em tempo inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada, conforme reza o art. 46 § 4º, C.P.
O parágrafo 1º do artigo 181 da Lei de Execuções Penais apresenta circunstâncias que convertem a pena de prestação de serviços à comunidade em uma pena privativa de liberdade, quando o condenado: a) não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido ou desatender à intimação por edital; b) não comparecer, injustificadamente, à entidade ou programa em que deve prestar serviço; c) recusar-se, injustificadamente, a prestar o serviço que lhe for imposto; d) praticar falta grave; e e)sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade cuja execução não tenha sido suspensa.

Interdição temporária de direito
Acontecia muito com a CNH. Hoje cai no Código de trânsito.
Proibição ao exercício de função pública, de atividade que dependa de autorização do poder público, de freqüentar determinados lugares.
Considerada uma das mais importantes modalidades de penas alternativas, é assim classificada pois reflete uma real limitação dos direitos individuais de uma pessoa.
O artigo 47 do Código Penal estabelece quatro modalidades de interdição temporária de direitos:
"I – proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo;
II – proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público;"
Tais sanções têm caráter temporário e exigem que o agente tenha praticado delito no exercício de cargo, função ou atividade, violando os deveres que lhes são inerentes, como afirma o art. 56 do Código Penal. Possuem tanto o aspecto punitivo, uma vez que recai sobre seu meio de vida, quanto o aspecto preventivo, pois não permite que o agente tire proveito da sua profissão ou do seu status para cometer atividades ilícitas. É forçoso reconhecer, então que nestas circunstâncias, é necessária uma correlação ato ilícito – atividade.
"III – suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo;"
O inciso acima se aplica aos crimes culposos de trânsito. Somente aos crimes culposos pois, com o advento do novo Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/97), foram criados tipos penais onde a suspensão da habilitação ocorre conjuntamente com outra pena restritiva de direitos, assim, foi derrogado em parte o inciso exposto acima, tendo validade apenas para os delitos culposos.
Geraldo F. L. Pinheiro ainda ensina que veículo, nesta norma, deve compreender não só os veículos automotores, como também os de tração animal e ainda os veículos automotores habilitados no exterior.
"IV – proibição de freqüentar determinados lugares"
A proibição de freqüentar determinados locais refere-se a ambientes que têm a ver com a conduta ilícita praticada e em que o indivíduo nele encontrará influência criminógena, sejam eles bares, boates, estádios de futebol etc.

Também dispõe a Lei de Execuções Penais sobre causas em que a interdição temporária de direitos será convertida em pena privativa de liberdade. Determina o parágrafo 3º do artigo 181 da Lei 7.210/84, que tal fenômeno ocorrerá quando o condenado exercer, injustificadamente, o direito interditado ou se ocorrer qualquer das hipóteses das letras a e e do § 1º deste artigo. Logo, estando em local incerto e não sabido, desatender a intimação judicial, ou sofrendo condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja execução não tenha sido suspensa, automaticamente revoga-se a alternativa penal.

Limitação de final de semana
Consiste na obrigação do condenado em permanecer durante cinco horas aos sábados e cinco horas aos domingos em “Casa do Albergado” ou estabelecimento congênere, a fim de ouvir palestras, participar de cursos ou outras atividades educativas.
A sanção prevista no artigo 48 do Código Penal consiste em permanecer, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em casa de albergado ou estabelecimento adequado. Podendo ser ainda ministrados cursos e palestras ao condenado ou à ele atribuídas atividades educativas.
Tal medida não deixa de ser, no entanto, similar à privação da liberdade, com o diferencial de que o apenado não sofrerá os efeitos negativos de um cárcere, nem perderá o contato com os elementos do mundo exterior, tais como família e trabalho.

Todavia, realizando uma análise perfunctória nesta regra, nota-se que ela possui natureza programática, pois, para que esta pena seja efetiva, é necessário que tanto as casas de albergado (que são poucas) quanto os estabelecimentos adequados sejam dotados de infra estrutura e pessoal especializado a fim de que o indivíduo, que por algum defeito em sua formação, receba necessária e específica reeducação para se reintegrar no meio social. Caso contrário, tal cominação seria apenas uma ficção jurídica como tantas outras em nosso ordenamento pátrio, tornando a sua aplicação inútil, senão impossível, como demonstra o v. Acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
"A limitação de fim de semana pressupõe a existência de instalações adequadas e equipes devidamente preparadas (arts. 152 e 153 da Lei 7.210/84). Assim, se o Estado não cumpre o disposto na lei (art. 203 § 2º, da lei cit.), inaplicável a medida prevista no art. 48 do CP" (TJSC – AC – Rel. Wladimir D’Ivanenko – RT 644/313)".
Portanto, para que a limitação de fim de semana seja dotada de plena eficácia, deverão ser efetuadas, em primeiro lugar, obras materiais que possibilitem a correta aplicação da norma, como, por exemplo, a aquisição ou desapropriação de prédios para instalação de casas de albergados.
Ademais, a Lei de Execuções Penais também cita circunstâncias pela qual a limitação de fim de semana se converte em pena privativa de liberdade. Diz o parágrafo 2º da referida lei, que a pena de limitação de fim de semana será convertida, quando o condenado não comparecer ao estabelecimento designado para o cumprimento da pena, recusar-se a comparecer ao estabelecimento designado pelo juiz da execução, recusar-se a exercer a atividade determinada pelo juiz ou se ocorrer qualquer das hipóteses das letras a (condenado em local incerto e não sabido, ou desatender intimação por edital) b (praticar falta grave) e e (sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja execução não tenha sido suspensa) do parágrafo primeiro do artigo 181 da lei citada.

Perda de bens ou valores
Não se trata da perda do produto do crime. (art. 91, II, “b”, CP), uma vez que este é efeito secundário da condenação.
Trata-se aqui, de pena que impõe ao condenado perda em favor do Fundo Penitenciário Nacional do montante que tem como teto o prejuízo causado ou a vantagem auferida com a prática criminosa.
Além da perda do patrimônio de origem ilícita (perda do produto do crime), será possível alcançar o patrimônio lícito até o montante do prejuízo ou vantagem do crime.
A perda de bens e valores está prevista no parágrafo 3º do artigo 45, do Código Penal. Salvo legislação especial, a perda de bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como teto – o que for maior – o montante do prejuízo causado ou da vantagem recebida pelo agente ou por terceiro, em conseqüência da prática da conduta típica.
Um caso exemplificativo de perda de bens e valores é aquele fornecido pelo Professor Damásio E. de Jesus, onde ele aponta o artigo 243 da Constituição Federal, onde prevê a expropriação de glebas destinadas a cultivo de drogas, que devem ser revertidas no assentamento de colonos, para cultivo de produtos alimentícios, ou destinadas a entidades sociais.
Resta, ademais, salientar que o instituto disposto no § 3º do art. 45, C.P., nada tem a ver com a perda em favor da União, tratada pelo art. 91, II, C.P. Como bem diferencia Victor Eduardo Rios Gonçalves, a perda em favor da União é um efeito secundário da condenação (aplicado conjuntamente à pena privativa de liberdade ou de outra natureza), dos instrumentos do crime, que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito, ou do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do ato criminoso.

Prestação pecuniária
Pode ser de um a trezentos e sessenta salários mínimos para a vítima, seus dependentes, entidade pública ou privada com destinação social (beneficente).
Poderá haver prestação inominada se houver aceitação do obrigado e não ferir a dignidade humana.
Conforme já foi aduzido, o rol das penas privativas de liberdade é exaustivo, não sendo possível a aplicação de qualquer outra pena senão aquelas explicitamente transcritas no texto legal. No entanto, era praxe de alguns juízos imporem ao condenado o pagamento de uma quantia determinada de "cestas básicas" para uma instituição de caridade já estipulada. Tal sanção, apesar de moralmente ser alvo de aplausos pela sociedade, era totalmente estranha aos olhos da lei. Por isso, com o advento da lei nº 9.714/98, esta anomalia foi eliminada.

Consiste a prestação pecuniária no pagamento em dinheiro (cujo quantum será não inferior a um, nem superior a trezentos e sessenta salários mínimos) à vítima, a seus dependentes, ou à entidade pública ou privada, com destinação social. Via de regra, a prestação pecuniária reverterá à vítima, se ela não puder ser beneficiada, seus dependentes. Não havendo vítimas nem dependentes, ou havendo aceitação de um deles, aí sim a prestação pecuniária reverter-se-á em prol de uma entidade social. Caso a pessoa tenha sido condenada a esta prestação, o valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários.
O parágrafo segundo estende o raio de alcance desta pena, uma vez que permite que a prestação pecuniária não precisa ser efetuada em dinheiro, podendo ser, devido ao seu caráter social, transformada numa outra prestação que tenha relevância pecuniária (com o pagamento de cestas básicas, por exemplo). Isso pode ocorrer desde que haja a concordância do beneficiário, que, no caso, é aquele que será favorecido pela nova forma de prestação.
Vale deixar anotado que, sobre o exemplo acima demonstrado, alguns doutrinadores, como Alberto Silva Franco são absolutamente contrários. Não cabe ao Poder Judiciário sustentar entidades assistenciais carentes de recursos e sim ao Estado. Para aquele que dispõe de dinheiro, nenhum caráter corretivo terá ele se dirigir a um supermercado e comprar o quanto foi estipulado pelo juiz, abastecendo assim, uma rede de entidades favorecidas.
Outro tópico que é digno de consideração, é esclarecer que prestação pecuniária e multa são institutos diferentes. Aquela, o montante adquirido é dirigido em favor de alguma pessoa (a vítima, dependentes, ou entidades públicas ou particulares com destinação social) denominada beneficiário, enquanto nesta o montante arrecadado se reverte em favor do Estado.

Multa
Consiste no pagamento calculado em dias multa.
Possui um sistema bifásico de aplicação.
O sistema bifásico possui como primeira fase a quantidade de dias e como segunda qual será o valor do dia-multa.
Quanto aos dias, pode ser aplicada a pena de 10 (dez) à 360 (trezentos e sessenta) dias, e se levará em conta:
a) circunstâncias do crime;
b) condição/capacidade econômica do apenado.
Quanto ao valor do dia-multa, deverá ser de 1/30 a cinco vezes o salário mínimo.
Aqui somente será levada em conta a capacidade econômica do apenado.
OBS: se o valor ainda assim for irrisório, o juiz poderá até triplicar a pena.
Importante: Pena restritiva de direitos pode ser convertida em privativa de liberdade. Pena de multa não, só poderá gerar dívida ativa.

Pena privativa de liberdade
A pena privativa de liberdade vem prevista no preceito secundário de cada tipo penal incriminador, servindo à sua individualização, que permitirá a aferição da proporcionalidade entre a sanção que é cominada em comparação com o bem jurídico por ele protegido.
Tipos de pena
São as penas de:

A - reclusão;
B - detenção;
C - prisão simples.

A - Reclusão
Na pena de reclusão admite-se o regime inicialmente fechado.
A regra é a seguinte:
1 - Para as penas computadas em mais de oito anos, aplicar-se-á o regime fechado.
2 - Para as penas computadas entre mais de quatro até oito anos, aplicar-se-á o regime semi-aberto.
3 - Para as penas computadas em quatro anos ou menos, aplicar-se-á o regime aberto.
No caso de reincidentes, aplicar-se-á o regime fechado.
O reincidente que tiver sua pena cominada em até quatro anos, poderá ter aplicado o regime semi-aberto, conforme súmula 269 do STJ.

B - Detenção
Não admite regime inicialmente fechado.

Neste caso, aplicar-se-á, para as penas acima de quatro anos, o regime semi-aberto.
Para as penas de quatro anos ou menos, aplicar-se-á o regime aberto.

C - Prisão simples
É aplicado em caso de contravenção penal.
Não admite regime fechado nunca, nem por regressão de regime. Somente regime semi-aberto ou aberto.
Neste caso, o apenado deverá ser recolhido em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum. Não deve nunca estar recolhido junto aos apenados com reclusão ou detenção.
[1] Sidou, J. M. Othon. – Dicionário jurídico.

Questões sobre teoria da pena

Questões de direito penal – Teoria da Pena



1 - Aponte a afirmação certa.
a) Na fixação da pena de multa, o juiz deve atender, principalmente, à situação econômica do réu.
b) A multa não pode ser aumentada até o triplo, se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica do réu, é ineficaz, embora aplicada no máximo.
c) A pena privativa de liberdade não superior a 6 meses não pode ser substituída pela de multa.
d) Ao fixar a pena de multa, o juiz deve ter em mente o crime praticado pelo réu, com vistas a majorá-la ou não.

2 - A Lei no 9.714, de 25 de novembro de 1998, que alterou dispositivos do Código Penal relativos às penas restritivas de direito,
a) somente criou uma nova espécie de penas restritivas de direito - perda de bens e valores -, admitindo a substituição da pena privativa de liberdade não superior a quatro anos nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa.
b) criou duas novas espécies de penas restritivas de direito - prestação pecuniária e perda de bens e valores -, admitindo a substituição da pena privativa de liberdade não superior a quatro anos nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa.
c) somente criou uma nova espécie de penas restritivas de direito - prestação pecuniária -, admitindo a substituição da pena privativa de liberdade não superior a quatro anos nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa.
d) criou duas novas espécies de penas restritivas de direitos - prestação pecuniária e perda de bens e valores -, admitindo a substituição da pena privativa de liberdade inferior a um ano.

3 - O preso pode freqüentar curso de nível superior?
a) Depende. O preso só pode freqüentar cursos compatíveis com o crime por ele praticado.b) Não. Em nenhuma hipótese o preso pode freqüentar curso de nível superior, por ser incompatível com o regime de abstinência de liberdade.
c) Sim. O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral.
d) Não. A freqüência a cursos de nível superior fica subordinada à plena liberdade do sentenciado.

4 - A conduta de adolescente descrita como crime ou contravenção penal é denominada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei no 8069/90) como ato
a) anti-social.
b) irrregular.
c) desviante.
d) infracional



5 - A pena restritiva de direitos não pode substituir a privativa de liberdade quando
o réu for reincidente
a) em qualquer crime, doloso ou culposo.
b) exclusivamente em crime doloso.
c) em crime culposo e a pena privativa de liberdade ultrapassar quatro anos.
d) específico.

6 - O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a
a) 30 (trinta) anos.
b) 25 (vinte e cinco) anos.
c) 20 (vinte) anos.
d) 35 (trinta e cinco) anos.

7 – O Código Penal de 1984 dividiu as penas em:
a) principais e acessórias;
b) privativas de liberdade;
c) restritivas de direito;
d) privativas de liberdade, restritivas de direito e multa.

8 – Detração significa:
a) a análise da conduta do criminoso para saber se agiu com dolo ou culpa;
b) o cômputo, na pena privativa de liberdade, do tempo de prisão provisória cumprida pelo réu;
c) punição para o condenado que tenta se evadir do presídio;
d) o cumprimento da pena em um regime mais severo, em virtude de condenação posterior ao início do cumprimento da pena.

9 – A pena de multa no sistema brasileiro:
a) é sempre fixada alternativa ou cumulativamente com a pena privativa de liberdade;
b) é calculado em dias-multa, sendo, no mínimo, e 20, e, no máximo, de 300 dias-multa;
c) tem como valor do dia-multa importância que pode ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente no país, mas não pode ser superior a cinco vezes esse salário;
d) consiste no pagamento, ao fundo penitenciário, de quantia fixada na sentença.

10 – Com relação às penas e seu cumprimento é correto afirmar que:
a) o condenado não poderá ser submetido, no início de cumprimento de pena, a exame criminológico de classificação para a individualização da execução;
b) a pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado ou semi-aberto e a de detenção em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado;
c) o condenado por crime contra a Administração Pública terá a progressão de regimes condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais;
d) o trabalho externo não é admissível, no regime fechado, mesmo em serviços ou obras públicas.

Gabarito - Questões sobre teoria da pena

Gabarito:


1) A
2) B
3) C
4) D
5) D
6) A
7) D
8) B
9) D
10) C