segunda-feira, 21 de junho de 2010

Questões direito penal II

Questões:
1. Acerca do instituto da prescrição penal e seus efeitos, assinale a opção correta.
a) A partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, começa a correr o prazo da prescrição da pretensão punitiva.
b) O reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva significa que o réu pode ser considerado reincidente caso pratique novo crime.
c) Ocorrendo a prescrição da pretensão executória, o título executório é formado com o trânsito em julgado; entretanto, o Estado perde o direito de executar a sentença penal condenatória.
d) Ocorrendo a prescrição da pretensão executória, a vítima não tem à sua disposição o título executivo judicial para promover a liquidação e execução cível.

2. Assinale a opção correta a respeito da prescrição.
a) O prazo de prescrição da pretensão punitiva é regulado pela quantidade de pena imposta na sentença condenatória.
b) No caso de evadir-se o condenado, a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena.
c) Se, entre a data da sentença e a data do recebimento da denúncia, houver ocorrido o lapso de tempo de prescrição regulado pela pena in concreto, dar-se-á a prescrição intercorrente.
d) O curso da prescrição é suspenso pela reincidência.

3- No que se refere às penas restritivas de direitos e à de multa, assinale a opção correta.
a) A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado, sendo aplicável às condenações superiores a seis meses de privação da liberdade, atendidos os demais requisitos legais.
b) A limitação de fim de semana consiste na obrigação de permanência, aos sábados, domingos e feriados, por oito horas diárias, em casa de albergado ou em outro estabelecimento adequado.
c) A pena de multa consiste no pagamento, ao fundo penitenciário, da quantia determinada na sentença e calculada em dias-multa, sendo, no mínimo, de dez e, no máximo, de trezentos e sessenta e cinco dias-multa, a ser fixada pelo juiz, não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a cinco vezes esse salário.
d) Se o condenado for reincidente, o juiz não poderá aplicar a substituição da pena privativa de liberdade, apesar de, em face de condenação anterior, a medida ser socialmente recomendável e a reincidência não se ter operado em virtude da prática do mesmo crime.

4- Com relação à pena de multa, assinale a opção correta.
a) Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa deverá ser paga no prazo de dez dias e será convertida em pena privativa de liberdade caso o condenado não realize o
pagamento.
b) É vedado o pagamento da pena de multa em parcelas mensais, dada a natureza jurídica de tal espécie de sanção.
c) Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da fazenda pública, exceto no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição, incidindo, nesse caso, as normas do CP.
d) Sobrevindo ao condenado doença mental, é suspensa a execução da pena de multa.

5- Admite-se a suspensão condicional da pena (sursis)
a) a reincidente em crime doloso, desde que a condenação anterior tenha sido exclusivamente à pena de multa.
b) para o condenado que, na data do fato, tenha idade acima de setenta anos, desde que a pena não seja superior a dois anos.
c) para o condenado em estado de saúde grave ou portador de doença incurável, desde que ele tenha reparado o dano.
d) em casos de condenação a pena restritiva de direito ou privativa de liberdade, desde que não superior a quatro anos.
6 - Em relação aos institutos da graça, do indulto e da anistia, assinale a opção correta.
a) Após a concessão do indulto, benefício de caráter coletivo outorgado espontaneamente pela autoridade competente, eliminam-se apenas os efeitos extrapenais da condenação.
b) Compete, privativamente, ao presidente da República conceder graça e indulto; já a anistia é atribuição do Congresso Nacional, com a sanção do presidente da República.
c) A anistia foi instituída por lei penal de efeito retroativo, que retira as consequências da ação criminosa já praticada, eliminando os efeitos penais e extrapenais da condenação.
d) Com a outorga da graça, benefício individual concedido mediante a provocação da parte interessada, eliminam-se os efeitos penais principais e secundários da condenação.

7 - João, dependente químico, com intenção de subtrair valores em dinheiro para aquisição de substâncias entorpecentes, entrou em um ônibus estadual e, munido de uma arma de brinquedo, anunciou assalto, ordenando que todos os presentes colocassem, em uma sacola que deixara no chão, os valores em espécie que possuíssem, ameaçando matá-los caso se recusassem a fazê-lo. Todos obedeceram à sua ordem e ele conseguiu subtrair, ao todo, R$ 500,00. João saiu do ônibus e, após uma perseguição policial que durou cerca de meia hora, foi preso. Considerando essa situação hipotética e o concurso formal de crimes, assinale a opção correta.
a) Como o valor subtraído ultrapassou minimamente o valor do salário mínimo em vigor, será possível aplicar o princípio da insignificância, ou da bagatela, para afastar a tipicidade da conduta de João, o qual deverá, consequentemente, ser imediatamente posto em liberdade.
b) Para o cálculo da prescrição dos crimes praticados por João, é indiferente o acréscimo que se realize em face do concurso formal de crimes, haja vista que, em tais situações, a extinção da punibilidade incide sobre a pena de cada um dos crimes,
isoladamente.
c) João praticou crime de roubo qualificado pelo emprego de arma, visto que, embora a arma empregada tenha sido de brinquedo, foi apta a amedrontar as vítimas, tendo o agente
conseguido consumar o crime.
d) A prisão em flagrante foi ilegal, dado que a perseguição policial tornou impossível a consumação do crime.

8 - Assinale a opção correta quanto à fixação da pena.
a) Na segunda etapa da dosimetria da pena, o juiz não pode reduzir a pena em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime,visto que tal possibilidade não está prevista expressamente em lei.
b) Será reincidente o réu que possuir condenação por crime anterior, ainda que esta não tenha transitado em julgado.
c) O CP adotou o sistema trifásico de fixação da pena, segundo o qual o juiz fixa a pena-base, considera, em seguida, as circunstâncias agravantes e atenuantes e, por último, as causas de aumento e de diminuição da pena.
d) Concorrendo circunstâncias atenuantes e agravantes, deve sempre prevalecer a circunstância atenuante, em respeito ao princípio in dubio pro reo.

9. A prescrição da pretensão executória do Estado
a) regula-se pela pena aplicada ao crime, aumentada de um sexto para os condenados reincidentes em crime doloso.
b) não pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa.
c) regula-se pela pena cominada ao crime, diminuída de metade se o condenado for menor de 21 anos de idade na data do fato ou maior de 70 anos na data da sentença.
d) tem por termo inicial o do início do cumprimento efetivo da pena privativa de liberdade imposta, ressalvados os casos de detração.
e) regula-se pela pena aplicada e pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa.

10. As penas restritivas de direitos, postas em relação às penas privativas de liberdade, no sistema adotado pelo Código Penal brasileiro são
a) autônomas e aplicam-se cumulativamente quando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado indicarem que essa cumulação seja necessária para prevenir e reprimir o crime.
b) subsidiárias e substitutivas pelo tempo da pena apli- cada não superior a 6 anos de reclusão para os crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa.
c) autônomas e substitutivas qualquer que seja a pena aplicada para os crimes culposos.
d) autônomas e substitutivas pelo tempo da pena aplicada não superior a 4 anos de reclusão.
e) subsidiárias e de aplicação cumulativa para os crimes culposos punidos com pena de reclusão até 4 anos.

terça-feira, 25 de maio de 2010

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O TRÁFICO DE PESSOAS

Um dos grandes desafios com que se depara a sociedade atual consiste no combate às atividades perpetradas por organizações criminosas, cujos tentáculos se estendem além dos limites territoriais estaduais ou nacionais.
O perigo difundido por tais práticas ilícitas é uma grande célula cancerígena que se dissipa difusamente pelo tecido social, acarretando efeitos nefastos, devastadores, para a manutenção da ordem social, da estabilidade da estrutura democrática, da organização familiar e coloca em risco a vida, a saúde física e psicológica, a segurança, de um número indeterminado de pessoas.
Nesse contexto, assume especial relevo o combate ao tráfico de pessoas.
O art. 3º do Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças (promulgado pelo Decreto n. 5017, de 12/03/2004), ao tratar do delito de tráfico de pessoas, o define como: "o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos” (grifo nosso)1.
Note-se que o tráfico de crianças e adolescentes, ao lado do tráfico de mulheres, para fins de exploração sexual, é uma das modalidades que mais tem crescido nos últimos tempos, conduzindo, inclusive, o legislador a instituir pela Lei Federal nº 9.970/ 2000, o dia 18 de maio como o “Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes”, data esta que tem desencadeado atos de mobilização social e política no intuito de promover a conscientização da população sobre a gravidade do tema.
1 Na legislação penal pátria diversos dispositivos legais, em harmonia, com o aludido documento internacional, tipificam de alguma forma a matéria: CP, arts. 149, §1º, inciso I e II; 198; 203, §1º, incisos I e II; 204; 206; 207, caput e §1º; 231 e 231-A, com a redação determinada pela Lei n. 12.015/2009; 245; Lei n. 6.815/80, art. 125; Lei n. 8.069/90, arts. 238 e 239; Lei n. 9.434/97, art. 14 e seguintes.
Nesse contexto, pode-se afirmar que crime de tráfico de pessoas é, atualmente, uma das formas mais graves de violação aos direitos humanos. As vítimas, geralmente, de baixa renda, via de regra, são ludibriadas, seduzidas por promessas de trabalho lícito e moral, em território estrangeiro ou nacional, mas chegando ao seu destino, transmudam-se em verdadeiro objeto de exploração sexual, escravidão, sujeitando-se a condições desumanas, degradantes.
O ser humano, no caso, é transformado em objeto, em algo passível de ser comercializado ou apropriado para satisfação dos interesses alheios e as mínimas condições condignas de existência são violentamente proscritas, menoscabadas, trazendo marcas indeléveis para a sua personalidade.
Por força da grande lucratividade e o baixo risco da atividade desenvolvida, traficar pessoas acaba sendo muito mais vantajoso para as organizações criminosas do que o tráfico de armas e drogas. Sem dúvida, é muito mais fácil a apreensão de um artefato ou substância entorpecente ilegal, do que a identificação do transporte ilícito de uma pessoa para fins de exploração, até porque o consentimento destas, muitas vezes, é obtido mediante fraude, como por exemplo, a realização de casamento com o aliciador estrangeiro, camuflando, portanto, o delito, o que dificulta sobremaneira a sua descoberta a tempo. Além do que, a mesma pessoa, ao contrário de uma arma ou droga, pode ser usada repetidamente, durante longo prazo, gerando lucros contínuos.
Em razão disso, o tráfico de pessoas, ao lado do tráfico de armas e de drogas, constitui uma das atividades criminosas mais lucrativas, chegando a movimentar mais de US$ 12 bilhões ao ano.
Diante desse assustador panorama, emerge a necessidade de alertar e mobilizar a sociedade e todos os órgãos públicos no sentido de combater prática tão execrável, que, além de servir de sustentáculo para as organizações criminosas, coloca em perigo bens jurídicos de importância vital para o Estado Democrático de Direito, posto que constitui uma das formas mais graves de violação aos direitos humanos.

Autor: Fernando Capez

sexta-feira, 7 de maio de 2010

As palavras que não escreví...

Advocacia agredida*

Antonio Cláudio Mariz de Oliveira**

Há poucos dias, assistimos estarrecidos à violência cometida contra o advogado Roberto Podval, defensor do casal Nardoni. Com destemor, competência e altivez ele exerceu o sagrado direito de defesa, em nome de acusados que já estavam condenados pela mídia e pela opinião pública. Foi alvo de agressão física e de inúmeras outras de natureza moral, que não o alcançaram por ser ele portador de inatingível dignidade pessoal.

A incompreensão histórica que nos acompanha, e que agora recrudesceu, faz com que os advogados sejam vistos como cúmplices do cliente.

Consideram-nos advogados do crime, e não porta-vozes dos direitos constitucionais e processuais do acusado, que, diga-se, são direitos e garantias de todos e de cada qual.

Portanto, violados quaisquer deles num caso concreto, mesmo se tratando de acusado notoriamente culpado, a próxima violação poderá atingir qualquer cidadão, ainda que inocente. Vale repetir à exaustão: nós, advogados, não somos defensores do crime, defendemos a obediência aos direitos e às garantias individuais.

Na atualidade o desprestígio da advocacia atingiu níveis inimagináveis. Pode-se afirmar a ocorrência de algo inédito em nosso país: a advocacia está sendo hostilizada.

Um Estado repressor e policialesco em franca formação, de um lado, e, de outro, uma mídia sedenta de escândalo e tragédia, especializada na teatralização do crime, têm contribuído para a construção de uma imagem negativa da advocacia e, o que é mais grave, têm contribuído para apequenar o próprio direito de defesa. Passou ele a ser considerado como desnecessário, inconveniente, instrumento de chicanas e de ganho para os advogados.

É estranho que a advocacia esteja sendo criticada em aspectos absolutamente comuns a outras profissões, que, no entanto, ficam impunes.

Fala-se que os pobres não podem contratar bons advogados por não poderem pagar os honorários, ficando carentes de assistência jurídica. Admitindo-se como correta a afirmação, também é correto dizer que os pobres são carentes de boa saúde, de adequada educação e de habitação digna. A culpa não é dos advogados, dos médicos ou dos engenheiros, mas sim da trágica desigualdade social que reina no País. Note-se que, no caso da advocacia, os carentes de recursos são assistidos ou pelos não poucos advogados que lhes atendem gratuitamente, ou pelos que, conveniados pelo Estado, lhes prestam assistência e recebem irrisórios honorários do Estado, ou ainda pelos competentes e dedicados defensores públicos.

Verbera-se, ainda, que advogados cobram honorários elevados. Trata-se de uma assertiva que, se verdadeira, não pode ser generalizada, pois a maioria esmagadora dos profissionais (200 mil só em São Paulo) enfrenta grandes dificuldades no mercado de trabalho. De qualquer forma, ela causa espécie. A contratação de honorários é ato bilateral - há quem cobre e há quem aceite e pague. Qual o motivo de estranheza ou de crítica? Para uma sociedade que supervaloriza o ganhar e o ter, em detrimento do ser, tal observação é ridícula, para não dizer hipócrita. Podem ganhar os jogadores de futebol, os artistas, os grandes médicos, cirurgiões plásticos, os arquitetos e decoradores, os empresários, os banqueiros, os jornalistas e apresentadores de TV, etc., etc. No entanto, dos advogados se parece querer exigir trabalho não remunerado.

Antes mesmo de o Estado se organizar tal como o conhecemos hoje havia aqueles que "eram chamados" para emprestar a sua voz - os chamados "boqueiros" - em prol dos que careciam de defesa. É verdade o que se diz: o primeiro advogado foi o primeiro homem que com a sua palavra defendeu um semelhante contra uma injustiça. Sempre fomos e seremos os "boqueiros" daqueles que não têm voz e não têm vez.

Qualquer cidadão, inocente ou culpado, ou titular de uma pretensão, procedente ou improcedente, tem o direito de recorrer ao Poder Judiciário para se defender e para deduzir a sua postulação. E nós, advogados, somos os agentes do exercício desses direitos perante quaisquer juízos e tribunais, pois exercemos com exclusividade a chamada capacidade postulatória. Somente nós, advogados, temos o poder de movimentar o Judiciário, que é originariamente inerte. No juízo criminal exercemos o direito de defesa, sem o qual o processo nem sequer pode ser instaurado. Somos, pois, o elo entre o povo e a Justiça.

A propósito da defesa no processo penal, mesmo os mais furiosos adeptos de punição contra os acusados deveriam respeitar e defender o direito de defesa, pois sem ele os seus instintos sanguinários nunca poderiam ser satisfeitos, a não ser pela vingança privada.

Nos momentos de ruptura institucional ou de obscurantismo social, os advogados sempre foram desrespeitados e agredidos. Napoleão Bonaparte desejou cortar a língua dos advogados. Durante a Revolução Francesa, Robespierre e o promotor Fouquier-Tinville impediram a atuação dos advogados na defesa dos acusados. Em menos de uma semana houve mais de mil condenações e decapitações. E, durante a Revolução, Malesherbes e Nicolas Barrier foram guilhotinados por exercerem a defesa.

A história recente do Brasil registra a heroica epopeia dos advogados que se opuseram com rara coragem e desprendimento às ditaduras getulista e militar.

Não estamos vivendo hoje um período de ruptura institucional, mas atravessamos triste período de verdadeiro obscurantismo, representado por uma cultura repressiva que se instalou no seio da sociedade e que reflete a intolerância raivosa, a insensatez, o ódio e o desejo de expiação e de vingança. Tais sentimentos não raras vezes atingem a advocacia.

Embora o caminhar seja árduo, e sempre o foi, continuaremos a seguir a nossa saga. Continuaremos a exercer o nosso glorioso ministério de postular pelo direito e pelo justo em nome de terceiros, em benefício da cidadania e da democracia.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Considerações gerais sobre o indiciamento e a identificação criminal do civilmente identificado

(Lei n. 12.037, de 01 de outubro de 2009)

Considera-se indiciamento a imputação a alguém, no inquérito policial, da prática do ilícito penal, sempre que houver razoáveis indícios de sua autoria. De acordo com Sérgio M. de Moraes Pitombo (Inquérito policial: novas tendências, Cejup, 1987, p. 38), o indiciamento “contém uma proposição, no sentido de guardar função declarativa de autoria provável. Suscetível, é certo, de avaliar-se, depois, como verdadeiramente, ou logicamente falsa. Consiste, pois, em rascunho de eventual acusação; do mesmo modo que as denúncias e queixas, também se manifestam quais esboços da sentença penal”.

É a declaração do, até então, mero suspeito como sendo o provável autor do fato infringente da norma penal. Deve (ou deveria) resultar da concreta convergência de sinais que atribuam a provável autoria do crime a determinado, ou a determinados, suspeitos. Com o indiciamento, todas as investigações passam a se concentrar sobre a pessoa do indiciado.

No indiciamento, a autoridade policial deve proceder à identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, salvo se ele já tiver sido civilmente identificado (CF, art. 5º, LVIII). A Súmula 568 do Supremo Tribunal Federal estabeleceu que: “A identificação criminal não constitui constrangimento ilegal, ainda que o indiciado já tenha sido identificado civilmente”. Contudo, a Constituição Federal, de 5 de outubro de 1988, em seu art. 5º, LVIII, assim dispôs: “O civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei” (grifo nosso). Com isso, passou a prevalecer o entendimento de que, com a nova regulamentação da matéria, a autoridade policial não pode mais submeter pessoa civilmente identificada, e portadora de carteira de identidade civil, ao processo de identificação criminal.

A norma constitucional em questão é de eficácia contida, uma vez que estabelece um princípio geral, o qual é passível de ser reduzido por meio de dispositivo inferior. Com efeito, embora a Constituição assegure que o civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, ressalva a possibilidade de o legislador infraconstitucional estabelecer algumas hipóteses em que até mesmo o portador da cédula de identidade civil esteja obrigado a submeter-se à identificação criminal. E tais hipóteses já foram estabelecidas.

A Lei do Crime Organizado (Lei n. 9.034/95), em seu art. 5º, preceituou: “A identificação criminal de pessoas envolvidas com a ação praticada por organizações criminosas será realizada independentemente da identificação civil”.

Posteriormente, a Lei n. 10.054, de 07 de dezembro de 2000, passou também a disciplinar a identificação criminal do civilmente identificado, surgindo, com isso, um precedente do STJ no sentido da revogação do art. 5º da Lei n. 9.034/95. Seu teor é o seguinte: “O art. 3º, caput e incisos, da Lei n. 10.054/2000 enumerou, de forma incisiva, os casos nos quais o civilmente identificado deve, necessariamente, sujeitar-se à identificação criminal, não constando, entre eles, a hipótese em que o acusado se envolve com a ação praticada por organizações criminosas. Com efeito, restou revogado o preceito contido no art. 5º da Lei n. 9.034/95, o qual exige que a identificação criminal de pessoas envolvidas com o crime organizado seja realizada independentemente da existência de identificação civil. (STJ, 5ª T., RHC 12.965/DF, rel. Min. Felix Fischer, j. 7-10-2003, DJ, 10 nov. 2003, p. 197).

A Lei n. 10.054/2000, porém, acabou por ser revogado pela Lei n. 12.037, de 01 de outubro de 2009, o qual passou a regulamentar o art. 5º, inciso LVIII, da Constituição Federal.

O novo Diploma Legal disciplinou no art. 2º as formas em que será atestada a identificação civil: (I) - carteira de identidade; (II) - carteira de trabalho; (III) - carteira profissional; (IV) - passaporte; (V )- carteira de identificação funcional; (VI) - outro documento público que permita a identificação do indiciado. E, ainda, dispôs que, para as finalidades da Lei, equiparam-se aos documentos de identificação civis os documentos de identificação militares (cf. parágrafo único).

O art. 3º da aludida Lei previu que, embora apresentado documento de identificação, poderá ocorrer identificação criminal quando: (I) o documento apresentar rasura ou tiver indício de falsificação; (II) o documento apresentado for insuficiente para identificar cabalmente o indiciado; (III) o indiciado portar documentos de identidade distintos, com informações conflitantes entre si; (IV) a identificação criminal for essencial às investigações policiais, segundo despacho da autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou mediante representação da autoridade policial, do Ministério Público ou da defesa; (V) constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificações; (VI) o estado de conservação ou a distância temporal ou da localidade da expedição do documento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres essenciais.

Dessa forma, ao contrário do antigo Diploma legal, não há mais qualquer menção à identificação criminal no caso de indiciamento ou acusação por homicídio doloso, crime contra o patrimônio mediante violência ou grave ameaça, crime de receptação qualificada, crimes contra a liberdade sexual e falsificação de documento público. Assim, o sujeito não mais será submetido à identificação criminal apenas pelo fato de estar sendo indiciado por este ou aquele crime, sem qualquer circunstância que justifique a cautela. No entanto, a Lei, de outro lado, no inciso IV possibilitou que, diante da prática de qualquer delito, a autoridade judicial em despacho decida acerca da essencialidade da identificação criminal, mediante representação da autoridade policial, Ministério Público, defesa ou de ofício.

E, ainda, segundo a letra da Lei: (a) as cópias dos documentos apresentados deverão ser juntadas aos autos do inquérito, ou outra forma de investigação, ainda que consideradas insuficientes para identificar o indiciado (art. 3º, parágrafo único). (b) quando houver necessidade de identificação criminal, a autoridade encarregada tomará as providências necessárias para evitar o constrangimento do identificado (art. 4º). (c) a identificação criminal incluirá o processo datiloscópico e o fotográfico, que serão juntados aos autos da comunicação da prisão em flagrante, ou do inquérito policial ou outra forma de investigação (art. 5º). (d) é vedado mencionar a identificação criminal do indiciado em atestados de antecedentes ou em informações não destinadas ao juízo criminal, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória (art. 6º). (e) no caso de não oferecimento da denúncia, ou sua rejeição, ou absolvição, é facultado ao indiciado ou ao réu, após o arquivamento definitivo do inquérito, ou trânsito em julgado da sentença, requerer a retirada da identificação fotográfica do inquérito ou processo, desde que apresente provas de sua identificação civil (art. 7º).

Recusando-se à identificação, nas hipóteses legais, o indiciado será conduzido coercitivamente à presença da autoridade (CPP, art. 260), podendo, ainda, responder por crime de desobediência.

Finalmente, dentre as providências a serem tomadas pela autoridade policial quando do indiciamento, deverá, ainda, ser juntada aos autos a sua folha de antecedentes, averiguada a sua vida pregressa e, se a autoridade julgar conveniente, procedida a identificação mediante tomada fotográfica, pois como já assinalado, a identificação criminal compreende a datiloscópica (impressões digitais) e a fotográfica (art. 5º da Lei n. 12.037/2009). As providências do inciso IX do art. 6º do Código de Processo Penal assumem especial relevância no momento da prolação da sentença, pois fornecem ao magistrado os elementos necessários à individualização da pena (CF, art. 5º, XLVI; CP, art. 59).




FONTE: Fernando Capez

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Crise nas prisões: Apoio do IBCCRIM ao Juiz de Minas Gerais

O Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) vem a público externar seu apoio ao Dr. Livingsthon Machado por ocasião da determinação da soltura de presos que se encontravam cumprindo pena em carceragens de delegacias de polícia no município de Contagem (MG). A decisão foi motivada pelas péssimas condições a que os presos estavam submetidos: capacidade populacional excedida em mais de seis vezes, ambiente insalubre, exposição a doenças infecto-contagiosas etc.

Trata-se de episódio em que o magistrado realizou sua função constitucional à plenitude, é dizer, ao observar agressão à dignidade humana, promovida pelo Estado, agiu o Juiz no sentido de afastar essa circunstância, não admitida em nosso ordenamento. Fez valer as garantias atinentes à pena, sobretudo a vedação de penas cruéis. Atuou tirando a poeira da seguinte frase, contida grosso modo em todos os manuais de processo penal e desmentida em todas as instituições totais brasileiras: “a pena atinge apenas a liberdade do preso, não se espraiando para aqueles direitos não atingidos pela sentença, tais como a integridade física, etc.”. Com efeito, quando a pena excede a previsão legal, isto é, a privação da liberdade, esta se transforma em mero exercício arbitrário de poder e deve o Judiciário zelar para que isso não ocorra, como bem fê-lo o Dr. Machado.

É bem verdade que soltar às ruas os presos não há de resolver o complexo problema da criminalidade ou aliviar as mazelas dos sistemas penitenciários. É igualmente verdade, todavia, que nenhum argumento de ordem administrativa ou orçamentária pode ser mais pesado, em um Estado Democrático de Direito, do que a dignidade humana.

Fonte: Instituto Brasileiro de Ciencias Criminais

sábado, 30 de janeiro de 2010

Crime habitual e habitualidade criminosa

Nas lições de Renato Brasileiro, o crime habitual exige uma prática reiterada de determinada conduta, por exemplo, casa de prostituição.

Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, casa de prostituição ou lugar destinado a encontros para fim libidinoso, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
A habitualidade criminosa, por sua vez, ocorre quando o agente faz do crime sua atividade frequente como meio de subsistência, por exemplo, o ladrão.